Diário de Bordo - parte 2.5 - de Marigê

 

Diário de Bordo, de Marigê Quirino Marchini.

São Paulo, 1958.

Parte 2 - Liturgia em azul bemol.

Neste blog, parte 2.5 - Devido a ser uma parte mais extensa, será apresentada em diversas seções neste blog. Se possível, as imagens serão posteriormente incluídas. 


pagina 75


Palavras moldáveis como o barro

para o que está só

albatroz

que ergue do canto deuses agradáveis

ante o dia da jornada. 



página 77


Quando chove nas catedrais, como hoje, 

o peito de suas colunas fica mais branco 

e pode abrigar

os pombos desamparados.

Nas cidadelas fechadas

cada adolescente trancará mais o seu segredo 

as salas quietas e os jardins quietos

e os guarda-chuvas mais quietos sobre as ruas. 

Só no adro das catedrais

haverá a revoada deste dia

onde os pombos serão os únicos enxutos.


página 79


Ondas 

não diferem entre a nau do sono 

e a nau da vida

porque uma silencia sobre a outra

e oculta nos ventos

a vela molhada de mistério.



página 81


De um passado tempo, aqui,

que marujo ébrio içará as velas 

domingo de manhã 

quando todos perguntarem o seu nome 

sua nacionalidade o nome de  seu barco

e a tripulação?

Ele nada saberá contar senão que

as paredes são como os fuzilados, erguidas contra as sombras

e ele preferia os peixes voadores. 



página 83 


CANÇÃO DE APOCALIPSE 


Nesta hora sem mundo

as paredes racharão

mais depressa sobre os deuses.


Nesta hora sem mundo

os cães latirão à outra face da lua,

vermelha.


Nesta hora sem mundo

nem as bengalas dos cegos

tatearão as cores perdidas. 


Nesta hora sem mundo

quem inventar uma flor sobre as mãos

não saberá o seu nome. 


Nesta hora sem mundo

o princípio é o futuro 

morto.


Nesta hora sem mundo

a canção mente porque tudo

já aconteceu.  



...

continua aqui

... 




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