Diário de Bordo - parte 2.7 - de Marigê

Diário de Bordo, de Marigê Quirino Marchini.

São Paulo, 1958.

Parte 2 - Liturgia em azul bemol.

Neste blog, parte 2.7 

...

página 99 


Vigília que os pássaros abrem.

Sem telhado de flores

e serenidade.

Apenas

o quieto recomeçar das algas 

e o murmúrio

das estrelas conformadas com o céu.


página 101 


O mesmo anjo 

que olha seu rosto no tom dos mares 

tem uma face de terra para a terra.

Porque as violetas acaso

não precisam de misericórdia? 



página 103  


Águas na concha temporal

marítimo abandono

tornadas.

Para qual desejo

sede dos dias mais remotos

servirão?

Se não houvesse

chuvas a ser regadas com poemas 

as marés cantariam o seu canto

doce. 



página 105


Repetição de algum azul.

Na fenda

a mais côncava da manhã,

o salgado reflexo

da corola marinha das hortênsias. 



página 107 


NOTURNO


Chuva de setembro ...

Contrabando em vidro 

de navios fantasmas.

Prisioneiros velhos 

colherão espigas 

que amadureceram 

no beiral das torres.

Barbatanas rosas

crescem nos aquários

transparentemente.

Quem vela sozinho

a última princesa

contará nos dedos

os séculos findos

e adormecerá.  


...


página 109


Mais intacta se ergue a hora.

Remar tranquilo que despede

todas as decisões,

que as ondas sejam oráculos de si próprias.

E eis a lua

tenra porque do mar, todavia solene;

gruta de torpor,

magia renovada do sinal,

também refúgio de albatrozes.

Hoje é um remar tranquilo que a turvou. 


...

página 111


Descansam as mãos

que fiaram e teceram

teceram

um rondó de mar

fiaram

uma lua redonda para o rastro

dos navios.

Quatro marujos

norte sul leste oeste

virão buscar

a irmã deles. 


...

fim da parte 2 

agora a parte 3: Margem





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