Diário de Bordo - parte 3.2 - de Marigê
Diário de Bordo, de Marigê Quirino Marchini.
São Paulo, 1958.
Parte 3 - Margem
Neste blog, parte 3.2
página 123
O silêncio
pêssego
melhor da viagem
Colhe-se
no cinzento mais cinzento
das chácaras abandonadas.
Há portões para abrir
com descuido porque são quebrados.
Orvalho até os joelhos.
Madrugada ocultando a meio
a razão de existir dos trevos:
suas folhas de ouro levantam
a sorte das estrelas cadentes.
Rajadas de árvores
rápidas, antigas ou musgo.
Assim são alcançados os degraus
onde a solicitude canta
e oferece
o silêncio
pêssego melhor da viagem.
página 125
Quando um gato de ouro com seu canto de ouro
abre as máquinas do sol
os meninos do sul vão descalços para os bosques
colher relógios.
página 127
BALADA DOS OCASOS
Nas tardes feridas
correspondem-se os ecos dos mirantes.
Mirantes são mirantes, mas também
os altos tetos das cidades
e as pontiagudas pedras das colinas.
Dizem o que os ecos dizem.
A importância única
são as leves frases flutuantes
que as aves de arribação
poderão interceptar
levando-as, flores sem sentido,
no selvagem canto;
em algum destino florirão
pôr de sol em um lago de peixes.
Que a mensagem final
intacta
será no ar noturno
apenas uma rajada
breve.
página 129
Assim que as madeiras
quaisquer - mesa, berço, porta,
sentem a hora dos bosques
latejar no cerne que resiste
florescem. E é tudo.
Mas a hora,
quem a trouxe da relva
com o orvalho
os mínimos encalços
e o programa dos ventos?
Esse eu não sei.
Talvez seja o que entra
por último em cada casa
e ainda tem nos bolsos
o partido que tomou em suas estradas:
a flauta
o perfume dos morangos
as solitárias mãos.
página 131
Tão descida a lua,
inocente e triunfal!
Protegem sua vinda
o salto branco dos lobisomens
e o canto monossilábico
das Iaras.
...
continua aqui
Comments
Post a Comment