Diário de Bordo - parte 3.4 - de Marigê
Diário de Bordo, de Marigê Quirino Marchini.
São Paulo, 1958.
Parte 3 - Margem
Neste blog, parte 3.4
página 145
Vem descendo o caminho um instante de vales.
Luzes apagadas
de violetas ocidentais
que definiram-se na sombra anterior.
Apenas seus perfumes
com os agora cincerros dos pinheiros
no sul orvalhado ...
Anjos pastores,
depois da canção matinal
guardaremos as flautas no fundo dos regatos.
...
páginas 147 e 148
folha folha
folhagem
sem folha
folia
vento
catavento
relento
lento
nau outonal
sem água
só folha. o casco, velame e o mastro
e o nome - folha.
marujo
direito e avesso de folha;
corpo e alma de haste
que quebra
folha que olha
nervuras
costuras de folha no olhar.
folhagem sem folha
o vento e o tempo
terra
erra
acerta
no outono
acerta:
folha folha
alma
palma
sem calma.
...
página 149
SUCESSÃO
As raízes que levantam os jardins
foram vagens
pesadas pelo dom perfeito.
Quem comeu de sua espera
e bebeu de sua chuva
é irmão com os pássaros do mundo.
A magnificência de ter asas
abertas no antes e liso dorso do sono ...
Será a vez
das glicínias serem plantadas
no voo do canto.
...
página 151
Esta a agricultura dos deuses:
um jardim solitário.
o espesso pinheiro das alturas
e a grama dos parques.
...
página 153
Glória aos lírios dos vales
e paz aos que não os colhem.
...
página 155
BALADA DA PORTA FECHADA
Sob os muros vigia
o galo
que inclina os olhos e roubando da garganta
a vasta aleluia
persegue em seu tempo o que perdeu:
o canto que afugenta dos fantasmas
os telhados dispostos a sonhar.
Sob as janelas
margaridas consideram a própria força.
Sobre os mirantes
revezam-se os vitrais na madrugada
tão guardado de qualquer vinda o acesso.
O que chegar, hóspede ou ladrão,
trocará o chamado e a ferramenta
por esta vigilância de silêncio.
...
página 157
VARIAÇÃO SOBRE O PRÍNCIPE E O MENDIGO
Sob o testemunho das baladas
trocam de alma o hóspede e o ladrão
sem muita diferença:
ambos abrem portas
são recebidos com o ladrar dos cachorros
e preferem as noites mais sombrias.
Quem perceberá o desigual no disfarce?
O ladrão sempre é triste para as rosas
pesadas demais para suas fugas.
...
..
continua aqui
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